livro Natureza humana Selecionei dez poesias contidas no livro para que se tenha uma mostra de seu conteúdo. É um livro interessante, pelo fato de ter sido totalmente escrito durante a adolescência. Fase em que a emoção fala muito mais alto do que a razão...

UM PEDAÇO DE AMOR

O amor é como tudo que é bom!
Uma coisa tão simples
Uma coisa tão bela.
É como a vida:
Um pote secreto
Num mundo perdido
No espaço obscuro
Da solidão permanente.
Uma cama chacoalha
Um palco que treme
Gritos no escuro
É o gol da vitória
Um beijo na boca
Sensações em alguém
É um toque nos seios
Arrepios pelo corpo
Pelo corpo daquela
Que foi ao delírio
Sem tempo pra nada
Como a gata no cio.
Lá fora há uma rua
Tão escura e perigosa
Como tudo no mundo.
Mas nestes corpos
Se encontra o calor
A claridade da vida
O amor verdadeiro
O mel que se espalha
Pelos corpos brilhantes
De prazer e harmonia
Numa noite qualquer
De um canto esquecido
Nesta vida perdida
No espaço obscuro
Da solidão permanente.

FUTURO QUE VIRÁ

O que passou, passou
O que restou, não sei
Pois a vida me espera
E lentamente seguirei
Por um caminho de prazeres
Que no futuro encontrarei
Para curtir a felicidade
Que tanto já tentei.
Num mundo de coisas boas
Mas difíceis de alcançar
Na realidade que se impõe
No presente que aqui está
Fazendo com que a gente
Se vire com o que tem
Para fazer do futuro
A felicidade que virá.

CORAÇÃO DE UMA FLORESTA

A manhã renasce para uma floresta
Gotas de orvalho são a provas da noite
Mas alheios ao mundo da natureza
Aparecem os homens e suas máquinas destruidoras
O primeiro estrondo se faz sentir na mata
Toda a vegetação se vê aterrorizada com o futuro.
Aves, insetos, outros bichos, todos gritando de horror
Estrondos e mais estrondos multiplicam-se a mil
Todos vivem juntos esta calamidade
O desmatamento, a destruição
Predadores e presas lado a lado
Envolvidos na empreitada de vida ou morte
Serras, tratores, gargalhadas se confundindo
Árvores e mais árvores a cair no chão.
Carregamentos saindo em busca da civilização
Milhares de metros perdia a floresta
No seu coração mais e mais vidas chegando
Refugiadas de suas antigas moradias.
A tarde chega para alivio dos habitantes
Os homens agora se vão, e com eles
Os estrondos, as serras, a destruição, também vão
Para só voltar com o novo amanhecer
E recomeçar a diária derrubada
Até alcançar o seio, o coração da floresta
Onde tudo e todos não terão direito à piedade
Para o auge da ignorância animal.

PENA

Pena, só imaginação
Foi tudo feito em vão
E agora o mundo é não.
Pena, só faltou um fim feliz
Por isso eu sempre fiz
Mas o destino nunca quis.
Pena, só sei que te amei
Quanto a ti, talvez, nem sei
Certo mesmo é que falhei.
Pena, só resta regredir
De nada valerá sorrir
O jeito mesmo é ir.

SUPER-HOMEM

De onde surgiu o homem?
Veio do macaco?
Ou foi Deus que o criou?
Se foi Deus, como conseguiu?
Levou uma semana fazendo maravilhas
Mas culminou com este espécime parasital!
Ele é o único que não se encaixa
Com o fascínio da natureza
Ou talvez aí esteja a sua lógica
A destruição é a sua sina
O ódio, a zanga, a traição
São as virtudes
O amor, o carinho, a compaixão
Os seus defeitos.
Mas que defeitos, se ele é feito
Para ser defeito, vergonha, aberração
Nem o mais absurdo dos “studios”
Poderia criar um super-herói assim,
Capaz de destruir tudo por um tostão
Fazer da guerra o orgulho de uma nação
E da sede de violência, o motivo do seu viver.

SER AMADO

Veja, as nossas mãos estão tremendo
Nossos corpos vão suando
Apesar do tempo frio.

Ouça, as palavras soam falhas
Nervosismo à flor da pele
Provocando inquietação.

Sinta, é o coração que bate forte
Uma vertigem sem sentido
Arrepios pelo corpo
Esperando ser tocado
Esperando ser amado.

Veja, as nossas mãos já não tremem
Nossos corpos relaxaram
E agora se aquecem entre si.

Ouça, essas palavras fluem soltas
Expressando tranquilidade
Toda paz que há em nós.

Sinta, o coração tão compassado
Uma alegria incontida
Revelada pelo corpo
Depois de ser tocado
Depois de ser amado.

INDÚSTRIA BÉLICA

Gera milhares de empregos
Milhões de dólares ao país
Eleva a vida de muitos
Poderes incomuns de se ver.
Transforma as pessoas,
Fazem-nas mais fortes
Defende o povo contra bandidos,
Protege o país contra invasores,
É invenção maravilhosa.
Coisa que só o homem
Seria capaz de criar.

Falo do “38” de um bandido
Na cabeça do trabalhador,
Falo da “metranca” automática
Fuzilando passageiros num avião.
Falo do explosivo plástico
Detonado numa estação,
Falo da atômica de Hiroshima
Acabando com uma cidade,
Falo dum tanque de combate
Atropelando um ferido,
Esmigalhando todos seus ossos.

São as armas sofisticadas,
Tecnologia a toda prova,
Guerra nas estrelas,
Status nas favelas.
O que seria de nossa gente
Sem essas máquinas extraordinárias?
Muita gente perderia dinheiro,
Outros não teriam emprego,
Menos divisas para o governo,
Por isso digo com todo direito
Mais indústrias bélicas precisamos.

ASSASSINATO IMPUNE

Plantas morrem pelas encostas
De uma serra que já foi do mar
Animais morrem em meio a feridas
De poluentes químicos, veneno atômico
Refinarias, homens. Siderúrgicas, homens
Usinas, homens. Poluição, homens
Desliza-se uma terra adoecida.
Desabam árvores ressecadas.
Isso tudo é encarado com empecilho para a sociedade.
Por isso os matar, assassinato impune.
Onde cantava o sabiá
Hoje só se houve o canto da morte
Onde pisava toda uma fauna
Hoje paira um pó viscoso
Sinais do tempo, o progresso está chegando
Vida rudimentar está acabando
Tecnologia humana a serviço do dinheiro.
Serra do mar, zona imobiliária, por isso assassinar.
O que é natural pode-se manufaturar
O que é fresco pode-se congelar
Uma mata é habitada por feras
Temíveis inimigos da civilização.
Por isso os matar, exterminar.
Não, não. Não há como advogar
A natureza não pode pagar
Assassinato impune vamos presenciar
Pois sem dinheiro o processo vai-se arquivar.

SEM GOSTO

Alcancei seus lábios
Saciei-me em seu corpo
Consegui o que queria.
Sexo, mostrar que sou o tal (?)
Mesmo assim sinto um vazio
Para que me valeu tudo isso?
Alguns minutos de prazer
Nem dor, nem amor
Apenas animais sem pudor
Num momento irracional.
Nada de intimidade, apenas falsidade
Coisa normal na sociedade.
Talvez ainda a veja, talvez não
Não importa, já transamos.
Não há tempo a perder
Há muita gente com quem meter
E uma só é chateação.
Até quando vai durar
Essa vida sem paladar.

RELACIONAMENTO HUMANO

“Antes mal acompanhado do que só”

Ouvi esta frase várias vezes
Achei absurdo, inconsistente
Hoje vejo que não estava certo
Que há momentos absurdamente mórbidos
Onde a escolha se torna tormenta
Viver na solidão do próprio espírito
Ou aceitar o jogo “economicus”
Estar acompanhado, porém sozinho
Enquanto há grana, há amigos.

Quis falar desse tempo crítico
Onde querer bem é desperdício
O “quente” é estar com quem pode
É uma lei sem parágrafos, nem artigos
Não existem registros em livros
Mas é viva na vida de todos nós
Esta fala da fraqueza de cada um
Da vontade de saciar necessidades
Falo da lei econômica, o dinheiro.

Quem não tem, se entrega só por ele
Quem tem, chupa os pobres até secarem.

Sinto uma inquietação cada vez maior:
A relação humana é mesmo natural?

Sem dinheiro, acho que não.