Arcebispo norte-americano pede a Bush que explique a seu povo porque os Estados Unidos são alvo de terroristas.
Íntegra da carta enviada ao presidente George W. Bush pelo cardeal arcebispo Bernard Law de Boston
"Senhor Presidente,
Conte a verdade ao povo, senhor presidente, sobre terrorismo.
Se as ilusões acerca do terrorismo não forem desfeitas, então a ameaça continuará até nos destruir completamente. A verdade é que nenhuma das nossas muitas armas nucleares pode proteger-nos dessas ameaças. Nenhum sistema 'Guerra nas Estrelas' (não importa quão tecnicamente avançado seja, nem quantos trilhões de dólares sejam despejados nele) poderá proteger-nos de uma arma nuclear trazida num barco, avião ou carro alugado.
Nenhuma arma sequer do nosso vasto arsenal, nem um centavo sequer os US$ 270 bilhões gastos por ano no chamado "sistema de defesa", pode evitar uma bomba terrorista. Isto é um fato militar.
Como tenente-coronel reformado e freqüente conferencista em assuntos de segurança nacional, sempre tenho citado o salmo 33: "Um rei não é alvo pelo seu poderoso exército, assim como um guerreiro não é salvo por sua enorme força".
A reação óbvia é: 'Então o que podemos fazer? Não existe nada que possamos fazer para garantir a segurança do nosso povo? Existe. Mas para intender isso, precisamos saber a verdade sobre a ameaça'.
Senhor presidente, o senhor não contou a verdade sobre o porquê de sermos alvo do terrorismo, quando explicou porque bombardearíamos o Afeganistão e o Sudão.
O senhor disse que somos alvo do terrorismo porque defendemos a democracia, a liberdade eos direitos humanos no mundo...
Que absurdo, senhor presidente!
Somos alvo dos terroristas porque, na maior parte do mundo, o nosso governo defendeu a ditadura, a escravidão e a exploração humana.
Somos alvo dos terroristas porque somos odiados. E somos odiados porque o nosso governo fez coisas odiosas.
Em quantos países agentes do nosso governo depuseram líderes eleitos pelos seus povos, substituindo-os por militares ditadores, marionetes desejosas de vender o seu próprio povo a corporações americanas multinacionais?
Fizemos isso no Irã, quando os marines e a CIA depuseram Mossadegh, porque ele tinha a intenção de nacionalizar a indústria do petróleo. Nós substituímo-lo pelo Xá Reza Pahlevi e armamos, treinamos e pagamos a sua odiada guarda nacional, Savak, que escravizou e brutalizou o povo iraniano para proteger o interesse financeiro das nossas companhias de petróleo.
Depois disso, será difícil imaginar que existam pessoas no Irão que nos odeiem?
Fizemos isso no Chile. Fizemos isso no Vietname. Mais recentemente, tentamos fazê-lo no Iraque.
E, é claro, quantas vezes fizemos isso na Nicarágua e outras repúblicas na América Latina?
Uma vez atrás da outra, temos destituído líderes populares que desejavam que as riquezas da sua terra fossem repartidas pelo povo que as gerou. Nós substituímo-los por tiranos assassinos que venderiam o seu próprio povo para que, mediante o pagamento de vultosas quantias para engordar as suas contas particulares, a riqueza da sua própria terra pudesse ser tomada por similares à Domino Sugar, à United Fruit Company, Folgers e por aí adiante.
De país em país o nosso governo obstruiu a democracia, sufocou a liberdade e pisou os direitos humanos. É por isso que somos odiados ao redor do mundo.
E é por isso que somos alvo dos terroristas.
O povo do Canadá desfruta da liberdade e dos direitos humanos, assim como o povo da Noruega e da Suécia.
O senhor já ouviu falar de embaixadas canadenses, norueguesas ou suecas a serem bombardeadas?
Nós não somos odiados porque praticamos a democracia, a liberdade e os direitos humanos.
Nós somos odiados porque o nosso governo nega essas coisas aos povos dos países do terceiro mundo, cujos recursos são cobiçados pelas nossas corporações multinacionais.
Esse ódio que semeamos virou-se contra nós para nos assombrar na forma de terrorismo e, no futuro, terrorismo nuclear. Uma vez dita a verdade sobre o porquê da ameaça existir e ter sido entendida, a solução torna-se óbvia.
Nós precisamos de mudar as nossas práticas. Livrarmo-nos das nossas armas nucleares (unilateralmente, se necessário) irá melhorar nossa segurança.
Alterar drasticamente a nossa política externa irá assegurá-la.
Em vez de enviar os nossos filhos e filhas ao redor do mundo para matar árabes, para que possamos ter o petróleo que existe sob suas areias, deveríamos mandá-los para reconstruir as suas infra-estruturas, fornecer água limpa e alimentar crianças famintas.
Em vez de continuar a matar milhares de crianças iraquianas todos os dias, com as nossas sanções econômicas, deveríamos ajudar os iraquianos a reconstruir suas estações elétricas, as suas estações de tratamento de água, os seus hospitais e todas as outras coisas que destruímos e que os impedimos de reconstruir com as nossas sanções econômicas.
Em vez de treinar terroristas e esquadrões da morte, deveríamos fechar a Escola das Américas.
Em vez de sustentar a revolta, a desestabilização, o assassínio e o terror em redor do mundo, deveríamos abolir a CIA e dar o dinheiro gasto por ela a agências de assistência.
Resumindo, deveríamos ser bons em vez de maus.
Quem iria tentar deter-nos? Quem iria odiar-nos?
Quem iria querer nos bombardear?
Essa é a verdade, senhor presidente.
É isso que o povo americano precisa de ouvir."
Bernard Law, arcebispo de Boston.
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