As ruas são espaços públicos, por onde passam ricos e pobres, novos e velhos e outros em boa idade, homens e mulheres, de cabelos curtos ou compridos, saia, calças, capote, lenços árabes, se assim aprouver ao dono. Uns passam, outros ficam, andam devagar ou mais depressa mas dão passagem aos que querem seguir. As ruas podem ser tortas, até tortuosas mas são como as linhas rectas que não têm princípio nem fim.
Hesitei em (re,re) publicar esta poesia, porque deveria ser muito mais conhecida.
Mas tenho chegado à conclusão que os alunos do ensino básico e secundário já não têm oportunidade de usufruir destas coisas.
Os programas mandam-lhes fazer relatórios, analisar textos de natureza diversa: contratos, requerimentos, regulamentos, artigos científicos e técnicos (será que ...?), reclamações (será que se habituam?), ... e também textos literários que sejam argumentativos, líricos... Estudam-se autores "a propósito de". Por exemplo, o Padre António Vieira, porque fez textos argumentativos.
A literatura medieval e o seu contexto quase desapareceram, não fosse uma disciplina optativa escolhida por uma minoria: Literatura Portuguesa.
Muitos autores teriam desaparecido, não fosse o bom senso de alguns professores.
Recordo aqui um que vai entrando no rol do esquecimento. Um alentejano, provavelmente do Torrão, entre os séculos XV e XVI. Também refere o abandono, problema actual:
ÉCLOGA II
Dizem que havia um pastor
antre Tejo e Odiana,
que era perdido de amor
per da moça Joana.
Joana patas guardava
pela ribeira do Tejo,
seu pai acerca morava
e o pastor de Alentejo
era, e Jano se chamava.
Quando as fomes grandes foram
que Alentejo foi perdido,
da aldeia que chamam o Torrão
foi este pastor fugido.
Levava um pouco de gado,
que lhe ficou doutro muito
que lhe morreu de cansado;
que Alentejo era enxuito
de água e mui seco de prado.
Toda a terra foi perdida;
no campo do Tejo só
achava o gado guarida:
Ver Alentejo era um dó!
E Jano, pera salvar
o gado que lhe ficou,
foi esta terra buscar;
e, se um cuidado levou,
outro foi ele lá achar.
[…]
Fonte: ruadealconxel.blogspot.com
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