TEMA

A chuva (ou, O sol).

A muito não vejo o sol, o bolor instala-se impiedoso pelas paredes. Baratas e traças surgem por toda parte. Há dias, minhas roupas no varal, tudo tem cheiro de mofo. A escuridão no horizonte não nos deixa animar, sair, nem pensar, não quero mais me molhar. O resfriado, a gripe, renite. Mas tenho que trabalhar, esta interminável chuva terei que enfrentar. O vento é seu aliado perverso, torna o guarda-chuva peça inútil, que só faz mais nos judiar. A água que escorre pelo pescoço, causando um ruim arrepio, indicio de piora do resfriado. As mais diversas formas de poças, os pés molhados por dentro do calçado. Uma neblina espessa, assustadora, apresenta-se mais adiante. E o ar condicionado do ambiente de trabalho espera para secar-me.

Ah! O sol! Como se fosse o Deus supremo no juízo final, abre passagem por entre as nuvens espessas e escuras, eliminando-as com vigorosos golpes de calor. Brilha violentamente refletindo sobre as águas empoçadas pelo chão limpo e escurecido. Eleva-se uma nuvem de fumaça partindo do asfalto, é a água, que sob ordens do sol, parte para seu reino de umidade a desaguar n'outro lugar. Assim as nuvens caminham apressadas, dando lugar ao gostoso e ansiado calor. Ele brilha renovado, e todos querem sair para cumprimentá-lo. Os bares, lugares, fervem de gente animada. As janelas de meu quarto podem ser reabertas, e os cômodos de minha casa voltam a ser claros. Saio a caminhar para apreciar o infinito horizonte.

Forte e ardente é o calor que emana da terra seca. A superfície onde piso, já transformada em pó leve e fino pela ausência da umidade, sobe com o pisar de minhas botas já amarronzadas, e entram pelas narinas causando leve asfixia. O suor escorre quente e vaporoso pela minha fronte ressecada, tão qual o território que vislumbro à minha frente. A caminhada torna-se longa e as imagens distorcem-se a beira do asfalto. A sola do pé arde e as meias não impedem a entrada do fino pó que causa fricção e consequente irritação na pele. Mas sigo, ofegante. Defronte a um sol que brilha veemente e impede o vislumbrar do horizonte.

Primeiro tímida, depois suave, e por fim, intensa. A chuva vem para alivio da natureza, para alegria dos passarinhos, e lava os telhados, os carros, a alma. Dá vontade de ficar nela, envolto em seus carinhos umidificantes. Matar a saudade do que a muito não se via, quase não se lembrava como era. O seu cheiro de terra, e água, e ar. Tenho que abrir as janelas, deixar este aroma entrar. Pulverizar a secura instalada em meu viver, umedecer as articulações do corpo, das coisas, da mente. Saio mais cedo para poder sentir seus pingos sobre meu corpo. Mal vejo sua cortina, tal qual um chuveiro ligado a meia força. Goteja em meus olhos com o frescor do renascer.

Autor: Arnold Gonçalves


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