O alarme toca, o povo para. Tal qual presa nos descampados, olha para todos os lados e não vê a fera. Ignora o aviso, volta ao pastar alienado. Mas o fogo é traiçoeiro, predador impiedoso que machuca muito antes de matar. Os brigadistas indicam a saída, tentam controlar, esperança de ajudar. O povo reclama, ainda não terminaram de comprar, este alarme falso tinha que soar? No Brasil, tudo parece ser movido pela desordem e indisciplina. E os brigadistas bem intencionados, mas mais que mal preparados, se veem diante da estagnação massiva contrária aos comandos emitidos. Então largam, abandonam as vítimas em pose de vítimas, e passam a ajudar apenas aqueles que lhes confiam a própria sorte.
Como todo plano, é lindo no papel, mas na prática, sempre uma porta que não abre, um teto que desaba, uma saída interrompida, e o pânico que cada vez mais se instaura. Enquanto os bombeiros não aparecem, grupos de desespero se formam, e qualquer iniciativa é seguida como uma ordem. Os brigadistas já estão fora com um leva de seguidores, mas muitos outros preferiram mais uma loja, mais uma venda, mais um fôlego de massa consumista. Agora são matéria prima para o fogo que predomina. Correm aleatoriamente como se fossem uma manada, cujo comando inicial é do elemento que está transitoriamente na frente. Só um verdadeiro comandante realmente os indica o rumo a seguir, é o fogo, predador implacável, que através do imenso calor vai forçando-os para o deslocamento rumo a pontos sem saída.
Banheiros, escadas, parapeitos, elevadores... Cada qual num ponto estratégico, e infelizmente, muitos em péssimos locais alcançados. Nenhum lugar é realmente bom numa hora dessas, mas alguns são letais, como é que após tantos anos lendo o mesmo aviso, ainda há quem corra para o elevador na hora de um incêndio? E os soldados do fogo finalmente chegam, após longa luta em meio ao trânsito caótico de quase toda grande cidade. A situação é grave, é preciso reforços, e aos poucos vão chegando de cidades vizinhas, mas o fogo é rápido e não tem medo de nada, em sua fome de consumir não espera pela próxima escada Magirus que está porvir. Com helicópteros, salvam vidas, de um em um, e neste momento pensamos, por que não seguiram os brigadistas quando era apenas um tocar de alarme? Por que o hidrante não funciona? Por que este prédio é tão alto? Custa tanto assim prevenir?
Autor: Arnold Gonçalves
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